segunda-feira, 14 de maio de 2018

Toquinho me disse não!


Era um domingo, por volta de duas da tarde. 

Voltávamos de uma viagem a Vitória e fizemos a habitual conexão no aeroporto de Congonhas. 

Ainda havia o restaurante no andar de cima, com uma excelente salada de salsão que eu adorava. Havia tempo e resolvemos almoçar. 

Estávamos em meia dúzia de pessoas e sentamo-nos ruidosamente numa mesa redonda. De repente um amigo alertou: “gente, o Toquinho está almoçando na mesa ao lado”. 

Eu, atrevido e cheio de euforia, disse que ia pedir um autógrafo. Era fã da música dele. Olhei para trás e o vi. Ele e mais dois homens, bebericando chope, comendo e proseando. Esperei acabarem de comer e me arrisquei. Todo mundo olhando; meus amigos me zoando, dizendo que ele não daria o autógrafo. “Esse cara é uma moça de tão educado”, argumentei. 

Aproximei da mesa e os três me olharam como se eu fosse um ET. Um frio apertou-me a boca do estômago. Não tinha como recuar. Pedi o autógrafo e o Toquinho, ele mesmo, o Toquinho cantor, me olhou com certa dose de comiseração e lascou: 

— Sabia que é “demodê” pedir autógrafos em restaurante? 

Perdi o chão. Senti um vácuo fazer vórtice dentro do meu cérebro. Um palavrão seguido de série de impropérios se formou na minha mente como um impetuoso tornado caribenho mas, antes que eu abrisse a boca, ele parece ter notado meu desconcerto, e disse que depois me daria o autógrafo. 

Não sei como regressei à mesa. Não sei se ria ou se chorava ou se voltava lá e... 

Os risos cessaram. Um silêncio tomou conta da mesa. Meus amigos tentaram ser solidários. Um deles me disse: “não julgue a obra dele; ele é apenas um ser humano como todos nós”. Eu engoli o orgulho, a vaidade, o ego, a raiva, a ira. E disse para mim mesmo que nunca mais iria ouvir nada daquele “demodê” imbecil. 

Passado uns dias, estava num bar quando a voz dele surgiu cantarolando: 

Eu, quantas vezes
Me sento à mesa de algum lugar
Falando coisas só por falar
Adiando a hora de te encontrar... 

A melodia chegou ao coração e naquele momento eu pensei: “que se dane o homem Toquinho. Vou ficar com a obra dele”. E deixei minha alma voar naquela melodia linda dele, de Vinícius e Carlinhos Vergueiro. 

Em tempo: ele não me deu o autógrafo e nem eu o cobrei. Continuo gostando da obra dele, que é o que o ser humano saber fazer de melhor. 


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